Logística Urbana: Um Caso de Imobilidade.

25-03-2013 11:25

 

Por Leonardo Sanches de Carvalho

As mudanças nos padrões de produção e consumo aliadas aos problemas de mobilidade e distribuição de produtos nas áreas urbanas das grandes cidades estão fazendo com que a logística se destaque como prioridade, desenvolvendo conceitos baseados nos princípios de suprimento contínuo (just-in-time) dos pontos de venda, de maneira a satisfazer necessidades de curto prazo. Essa prática exigiu uma rápida adaptação e resposta das empresas às exigências imediatistas do mercado, porém, acarretou em um aumento significativo dos serviços de transporte e distribuição.

O cenário em questão coloca luz em um dos segmentos da logística que vem demandando por maior atenção nos últimos anos. Trata-se da logística urbana, também conhecida como logística de última milha. A logística urbana atua e traz conseqüências diretas para o ambiente urbano, uma vez que se utiliza de sua infraestrutura, potencializando os problemas pré-existentes nas grandes metrópoles, como os congestionamentos, a poluição e o risco de acidentes.

A área de logística é responsável por garantir com eficiência o fluxo físico de bens e de informações entre os diversos atores da cadeia de suprimentos. No cenário urbano, esse fluxo se caracteriza, principalmente, pelo transporte e movimentação de mercadorias. Como consequências dessas operações, destacam-se os problemas de desgaste prematuro da infraestrutura urbana (dimensionamento inadequado para veículos pesados), dificuldades ao fluxo de veículos e pedestres, por conta de carregamentos e descarregamentos realizados, costumeiramente, em locais inadequados e sem estrutura. Consequentemente, esse fluxo intenso, o ambiente hostil e o desgaste viário culminam em risco potencial de aumento na probabilidade de acidentes, além de se configurar como uma importante fonte de poluição sonora e atmosférica, que ameaçam à sustentabilidade das áreas urbanas no viés ambiental. Percebe-se ainda, alta criticidade no viés econômico, por conta dos elevados custos dos intermináveis congestionamentos.

É fato que as últimas décadas foram marcadas por significativos avanços da iniciativa privada no nível de serviço logístico, com objetivos claros de redução de custos operacionais e definição de estratégias inovadoras, eficientes e colaborativas de transporte, distribuição, armazenagem e gestão integrada da cadeia de suprimentos. Já os programas de governo e políticas públicas visaram, prioritariamente, a criação e/ou desenvolvimento das infraestruturas básicas ou especializadas como: rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos, terminais multimodais, plataformas logísticas, centros de distribuição e portos secos. Infelizmente tais empreendimentos estruturantes não estão acontecendo na velocidade compatível com as necessidades do país.

É de conhecimento público que alguns dos principais problemas da logística no Brasil são:

  • Grande dependência do modal rodoviário;
  • Portos deficitários;
  • Modal ferroviário muito limitado;
  • Transporte público ineficiente e muito carente de alternativas;
  • Burocracia excessiva e distorções fiscais;
  • Restrições da malha viária – manutenção, capacidade, insegurança, etc.

O Ministério das Cidades lançou em 2011 o Programa de Mobilidade Urbana que tinha como objetivo a melhoria da mobilidade urbana nos grandes centros, priorizando o deslocamento não motorizado, o transporte coletivo e a redução da emissão de poluentes, dos acidentes e dos congestionamentos. Além de honrar os compromissos com a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Esse Programa deveria trabalhar em consonância com as ações do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento – buscando soluções para os problemas de logística e de mobilidade. No entanto, o país se depara com um verdadeiro processo de “Imobilidade” no que se refere ao Programa de Mobilidade Urbana do Governo Federal, pois em 2011 foram executados apenas 0,02% do valor previsto para o período. Esperava-se que a Empresa de Planejamento e Logística (EPL) desse maior celeridade aos projetos de infraestrutura. Entretanto, os projetos de concessões ou PPPs ainda não saíram do papel, ou sequer foram colocados nele. Muita coisa, até agora ficou apenas no discurso.

Os programas estruturantes “não andam”, porém as grandes cidades não podem parar! Estudos do CSCMP – Council of Supply Chain Management Professionals mostram que a última milha representa, em média, 28% do custo total de transporte e representa aproximadamente 30% do volume de tráfego nas grandes cidades. É responsável também por 20% a 35% das emissões de gases de efeito estufa, além de representar entre 15% e 20% dos acidentes gerados nas redes viárias urbanas. Portanto, a última milha se configura como o grande desafio das organizações no que tange a otimização da gestão da cadeia de suprimentos.

O aumento da maturidade por parte do mercado consumidor vem criando um cenário cada vez mais desafiador para as organizações no que se refere à logística da última milha. O crescimento exponencial do e-commerce e as entregas fracionadas com distribuição diária acabam gerando uma espécie de competição pela malha viária entre os veículos comerciais, os privados e os de transporte público coletivo, gerando assim grandes congestionamentos. Somada a essa concorrência, percebe-se nos grandes centros urbanos deficiências estruturais relativas a alternativas de acesso, ocupação indevida de locais públicos e insuficiência de locais apropriados para carga e descarga.

Se não bastassem todos os problemas estruturais, a logística de última milha ainda precisa se adaptar as políticas públicas que tem por objetivo a melhoria da mobilidade urbana. No entanto, na maioria das vezes acabam entrando em conflito com as boas práticas da logística empresarial, pois, estão relacionadas a operações cooperadas, janelas de entregas, espaços predefinidos para carga e descarga, limitações de tráfego, entre outras. Todas essas ações acabam limitando o diferencial competitivo das organizações.

Geralmente o poder público estabelece “modelos” e/ou “padrões” que deram certo em outros lugares (cidades ou países), porém, as questões geográficas e culturais precisam ser levadas em consideração, pois, o que serve em uma localidade, não necessariamente servirá para outra, face ao contexto e a quantidade de atores e interesses diferentes que atuam no processo.

Assim sendo, percebe-se que a logística urbana traz consigo processos bastante heterogêneos e necessita de forte integração entre o setor público e o privado, visando alinhar os objetivos de eficiência logística e desenvolvimento econômico com fatores preponderantes para o planejamento das grandes cidades, como as questões relativas a poluição e a mobilidade urbana.

Por conta dessa integração preconizada, alguns modelos operacionais de logística urbana têm sido implantados com relativo sucesso em países da Europa. Entregas Noturnas, Corredores Urbanos de Distribuição, Centros ou Plataformas Urbanas de Distribuição são exemplos de implantações bem sucedidas com vistas à redução dos custos logísticos nos grandes centros.

Na última década, essas iniciativas e estratégias integradas de cooperação e planejamento das grandes metrópoles para a resolução dos problemas da logística urbana culminaram no conceito de City Logistics, principalmente em países com a Alemanha, Espanha e Bélgica.

Para chegar ao patamar de uma City Logistics as grandes cidades brasileiras necessitariam de intervenções arrojadas nos setores público e privado, que passariam por investimentos estruturantes, ajustes na legislação e modificações no comportamento, geralmente passivo nas questões de infraestrutura, das organizações. Certamente, até a sociedade enfrentaria dificuldade de adaptação a esse novo cenário, justamente pelo fato de ter se acostumado com um padrão de serviço logístico que não privilegia a integração.

Enfim, a logística urbana envolve questões de altíssima complexidade por ter vieses políticos, sociais, de infraestrutura, tecnológicos, institucionais e de governança, e cuja resolução requer uma integração entre atores de diversos segmentos da sociedade, tornando-a de difícil implementação e politicamente pouco sustentável.

 

O Engenheiro Leonardo Sanches de Carvalho atuou em empresas de grande porte como a Vale e a General Electric, durante treze anos foi gerente da Área de Logística e Gestão da Produção do SENAI CIMATEC e, atualmente, integra o Núcleo Estratégico do SENAI da Bahia.

A opinião expressa nos artigos da seção "Opinião" é de responsabilidade integral dos signatários.

 

Voltar

Comente esse artigo.

Data 22-12-2014

De zacarias127@hotamil.com.br

Assunto Texto

Responder

Obrigado Dr. Leonardo. Você é um exímio formador de OPINIÕES. Valeu!!!!!

Data 11-08-2014

De carlos3americas@hotmail.com

Assunto texto

Responder

legal

Data 11-08-2014

De aureabetania01@hotmail.com

Assunto texto

Responder

ok

Data 07-04-2013

De Pabliane Castro

Assunto Ajuda

Responder

Caros, bom dia!
Gostaria de lhes perguntar qual o e-mail do Engenheiro Leonardo Sanches de Carvalho, pois sou graduanda Arquitetura e Urbanismo e em minha monografia estou estudando sobre a logística e distribuição de cargas no estado de Minas Gerais, e gostaria de lhe fazer algumas perguntas.
Obrigada

Data 16-04-2013

De Leonardo Sanches de Carvalho

Assunto Re:Ajuda

Responder

Você encontrará o e-mail na seção "Nossa Equipe" desse site.