'Porto é a chave', diz o presidente da Fieb.

'Porto é a chave', diz o presidente da Fieb.

 

O SITE DA LOGÍSTICA traz a entrevista com com o Presidente da Fieb, José Mascarenhas, publicada no Correio. Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), José de Freitas Mascarenhas, o seminário Agenda Bahia é um canal poderoso para levar à sociedade as questões que emperram o desenvolvimento econômico do estado, como a infraestrutura deficiente, em especial o problema dos portos. Em entrevista ao CORREIO, ele fala sobre alguns dos temas que mais preocupam a entidade que dirige e estão sendo discutidos no Agenda Bahia.

Dados do IBGE relativos a 2009 indicam que a economia baiana perdeu participação no PIB nacional, caindo da sexta para a sétima posição. Isso é uma tendência?
Minha percepção é de que seja uma crise conjuntural, porque a Bahia trabalha muito com commodities e esses produtos foram os mais afetados na crise de 2008/2009. E ainda não temos os números de 2010. No caso da indústria de transformação baiana, eu não vejo isso. Eu gosto de olhar na série, num espaço maior, de 12 meses. E aí não estamos tão ruins, porque a indústria atual está produzindo. O que se pode dizer é que não está havendo acréscimos capazes de manter a posição. Há muito não temos uma grande indústria se instalando no estado. A última foi a Ford. Há uma série de análises sendo feitas, mas quando se olha a infraestrutura, a nossa deficiência em portos, é evidente que se pode perder indústrias. Nenhuma grande indústria vem para fornecer ao mercado local, que não tem escala. Todas vêm para vender para fora e também para importar. Então, porto é a chave nisso.

O que fazer para atrair novos investimentos?
O que falta é desenvolver uma política que seja permanente de atração de indústrias, melhorando a competitividade. A Bahia tem uma economia de um tamanho que, por si mesmo, já é capaz de atrair novos negócios. Mas é preciso melhorar, porque, com a redução dos incentivos, não se tem mais como justificar a vinda de empresas com esse tipo de estímulo. Então, o que se tem a fazer é reduzir o custo de produção, proporcionando infraestrutura, o que resulta em melhoria de custos e de desempenho. O efeito é o mesmo dos antigos incentivos.

A Fieb está concluindo um trabalho de planejamento para servir de base a uma política para o setor industrial do estado. Em que consiste esse planejamento?
A Fieb foi contratada para fazer esse trabalho para o governo do estado e para a Petrobras. É o Projeto Aliança, que já está concluído e depende agora de análise do governo. Trata-se de dar um rumo ao crescimento industrial. Como isso interfere transversalmente com vários elementos e fatores de desenvolvimento econômico, é claro que abrange grande parte da economia. Aí entra energia, infraestrutura, esses elementos que, sem eles, não se pode ter desenvolvimento industrial.

O que falta para resolver os problemas de deficiência dos portos baianos?
O Brasil precisa de portos modernos, porque o país está entre os emergentes e concorre com gente que tem uma infraestrutura portuária muito bem montada, como os chineses e mesmo os indianos. Aqui não se dá importância a isso. Temos tudo, engenharia, empresas, recursos, mas não conseguimos avançar, porque a burocracia estatal nem faz, nem permite que se faça. Na Bahia, estamos num impasse há muito tempo, e aqui é mais grave, porque nossos vizinhos fizeram portos, seja por ação política ou o que for. Esse é o caso de Pernambuco e Ceará. Nossas cargas saem daqui e vão para lá. E a gente continua nesse marasmo. O que temos de mais moderno é o terminal de contêineres, só se tem isso. Aratu está sucateado. Há quem queira investir, mas persiste um impasse institucional. Precisamos de uma política de ação. Um porto bom, por si mesmo, é um fator de atratividade para novas empresas.

Como está reagindo a indústria brasileira, diante da concorrência de outros emergentes mais preparados, principalmente a China?
A indústria de transformação no Brasil está perdendo muita substância, perdeu posição relativa na economia do país. O empresário faz o que é necessário para sobreviver. Quando acha que está perdendo competitividade e não tem solução vai produzir na China e exporta para cá. Nós estamos perdendo atividade industrial e ganhando atividade comercial. Quem está salvando o Brasil são os setores básicos, relacionados a recursos naturais, porque isso eles não têm lá. São esses recursos que estão pagando essa perda de substância da indústria.

O que nos torna tão vulneráveis em relação à China?
A China tem uma situação particular e insuperável, porque fez uma economia que tem parâmetros que ninguém tem. Possui uma poupança inigualável, e é essa poupança que dá capacidade ao país de manter o câmbio que tem, sem precisar de recursos externos. Nós precisamos ter um juro alto para atrair recursos externos. Então, temos um problema macroeconômico mal solucionado. Nossa política fiscal é frágil, precisaríamos reduzir bastante as despesas para ter capacidade de investimento, sem precisar atrair tantos recursos de fora. Mas, para fazer isso, seria preciso enfrentar um problema político grande, e isso inguém quer. Então, não é só condenar os chineses, é olhar o que eles fazem, e como fazem. Por exemplo, nessa questão de portos, que culpa eles têm de serem eficientes? Não é só uma questão de não haver democracia, porque há democracias que funcionam, a Suécia, a Noruega. A verdade é que não podemos culpá-los de ser o nosso algoz.

Além de melhorar a infraestrutura, o que mais é possível fazer para tornar o país e o estado mais competitivos no setor industrial?
Um caminho importante é a inovação. Aqui, temos o Cimatec (Centro Integrado de Manufatura e Tecnologia) que é considerado o melhor do Brasil. Isso é outro elemento que atrai empresas. Conseguimos fazer lá um centro de referência, não só no treinamento de mão de obra, mas também no desenvolvimento de tecnologia, de criação de novas versões de produtos. Temos ainda o centro dos Dendezeiros que é mais geral, onde são treinadas cinco mil pessoas por ano na construção civil. Nós temos um lema na Fieb: ninguém deixa de se instalar na Bahia por falta de pessoal qualificado. É só procurar o Senai e fazer acordo para isso.

O senhor tem manifestado preocupação com o problema da mobilidade urbana em Salvador. Na sua opinião, o que se pode fazer para mudar o quadro atual?
Embora venha falando apenas como agente provocador, considero que este talvez seja o principal problema da cidade hoje. E mobilidade não só como um problema de transportes, mas uma questão conectada com a própria estratégia de desenvolvimento urbano. Por exemplo, podemos fazer uma estratégia de desenvolver novas áreas, com o intuito de que sejam autossuficientes em termos de sua própria sobrevivência. Com isso, eliminamos grande parte do transporte. Ou aproveitar a infraestrutura já implantada e utilizá-la de uma maneira mais eficaz. Com isso, vamos reduzir a necessidade de investimento. Podemos tomar o partido de valorizar o centro da cidade, recuperá-lo para residência. Esses dois itens, habitação e transporte, são essenciais para a mobilidade urbana.

Em síntese, seria uma questão de planejamento?
Acho que isso é a coisa mais importante que se tem que fazer por essa cidade, enquanto ainda é tempo, porque depois fica impossível. E no meio disso tudo é preciso ter transporte público de qualidade, até para reprimir o automóvel. Inclusive estou advogando que venha um escritório do exterior, para se agregar a um escritório local. Isso para não nos acostumarmos com o que existe no Brasil em termos de política. Aqui, quando se faz alguma coisa, se pensa que está fazendo muito. Mas se pegarmos cidades mais tradicionais, a qualidade de vida é bem diferente, porque há planejamento.

A seu ver, qual o papel do Agenda Bahia na difusão e conscientização da sociedade em relação a essas questões?
Acho que o Agenda Bahia tem o mérito de discutir todas essas questões, de lançar para a população esses assuntos. Estamos inteiramente aderentes à questão da mobilidade urbana, considerando que este talvez seja o principal problema da cidade de Salvador hoje. É, inclusive, o primeiro item a ser abordado na abertura dos seminários de nossa Agenda. Essa questão da mobilidade em Salvador eu quero levantar, ao lado da questão dos portos. Porque portos são outro problema, o Brasil precisa de portos modernos. O Agenda Bahia proporciona uma excelente oportunidade para abordar e discutir todos esses temas. Só o sistema de mídia tem condições de fazer isso, de colocar para a sociedade todos esses problemas, como o Agenda Bahia faz.

Fonte: Correio - Adaptado pelo Site da Logística.