Temos muito a fazer na economia industrial da Bahia.

Temos muito a fazer na economia industrial da Bahia.

Os bons resultados da economia e o incremento da produção industrial em 2010 não foram suficientes para trazer um horizonte de otimismo para a indústria baiana. Os entraves na política monetária, fiscal e a infraestrutura deficiente mostram que a Bahia ainda tem um longo caminho a percorrer para desenvolver a produção industrial. Para discutir sobre estes desafios, A Tarde conversou com José de Freitas Mascarenhas, Presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb). Ele faz uma análise da conjuntura e traça perspectivas para a indústria baiana no ano que se inicia. O Site da Logística reconhece a relevância e importânica do tema e disponibiliza a entrevista na íntegra para os seus Internautas.

A TARDE: Qual avaliação do senhor sobre o desempenho da indústria baiana em 2010 e quais questões devem permear o setor no ano que se inicia?

José de Freitas Mascarenhas: A indústria da Bahia está condicionada ao ambiente nacional. Foi um ano de crescimento, de bons resultados. No entanto, não resolvemos os problemas relacionados à taxa de câmbio e às contas externas. O déficit em conta corrente está alto e vai aumentar. E isso tem muito a ver com a indústria, principalmente a parte que está perdendo capacidade competitiva. Estamos vivendo um verdadeiro avanço de importados, principalmente os chineses. Alguns industriais se transformaram em comerciantes porque é melhor para eles importarem do que produzirem aqui. É preciso criar condições para conter este avanço.

A TARDE: Como superar esta tendência de desindustrialização?

José de Freitas Mascarenhas: Isso é de solução complexa e não vejo solução pela manipulação de câmbio. Os resultados a frente nunca serão bons. Quem conduz essa situação são as duas principais economias, a norte-americana e a chinesa. E nós somos reflexo desta disputa política, de maneira que não adiantam essas medidas que o Banco Central tomou de aumentar o IOF (Imposto de Operações Financeiras). Elas trouxeram mais prejuízos do que resultados positivos. O que se deve fazer é ampliar a competitividade da produção brasileira.

A TARDE: De que forma?

José de Freitas Mascarenhas: É preciso uma série de programas que o governo brasileiro deve conduzir de maneira inteligente. O primeiro deles é melhorar a infraestrutura, aumentar os investimentos, melhorar o desempenho dos nossos portos, estradas e ferrovias. O segundo é melhorar a educação, que é elemento de produtividade extremamente importante. Também devemos desenvolver a inovação, para, com criatividade, produzirmos com mais qualidade e custos menores. Além disso, é preciso fazer mudanças na política fiscal para reduzir gastos. Não sei até que ponto o próximo governo está disposto a fazer isso. Também é preciso melhorar a poupança para financiar todos estes empreendimentos. A Bahia tem uma economia centrada no comércio exterior.

A TARDE: Como superar o cenário desfavorável para as exportações?

José de Freitas Mascarenhas: O mercado externo está com dificuldades, com exceção de algumas áreas que vão bem, como os minérios e alimentos. As indústrias que estão mais voltadas para mercado interno têm mais saúde neste instante. Por isso, o governo está analisando medidas para auxiliar as indústrias com foco no mercado externo. Aqui na Bahia, estamos trabalhando para ordenar o crescimento da economia industrial. Vamos verificar quais são os campos mais fáceis de crescimento. Possivelmente, se a Bahia tiver sucesso nessas encomendas de navios da Petrobras, haverá uma abertura para toda uma cadeia de fornecedores para a indústria naval, além de conformar o setor mecânico aqui no Estado. Tem a indústria de celulose que está exportando bem e tende a crescer. Também vamos analisar com alguma profundidade o complexo da Ford para baianizar mais essa produção. Vamos aumentar a assistência ao pessoal do oeste e de Feira de Santana.

A TARDE: Há previsão de uma maior diversificação da matriz industrial da Bahia?

José de Freitas Mascarenhas: Vamos analisar as cadeias que não estão bem-sucedidas no Estado. Por exemplo, a cadeia têxtil poderia ser bem maior. Vamos analisar para ver o que pode ser feito no sentido de melhorar o seu desempenho aqui. Também vamos analisar o setor eletrônico de Ilhéus para termos um conhecimento mais profundo de como ele está se desenvolvendo e qual o melhor caminho para a sua sustentabilidade futura. Para isso tudo, estamos ampliando a atuação do Cimatec, que hoje é um centro de formação industrial de ponta, para suportar esses setores que achamos que deve ter crescimento. Temos muita coisa a fazer na economia industrial da Bahia. Isso vai sendo feito aos poucos, mas continuadamente.

A TARDE: De que forma pode ser feita interiorização das indústrias na Bahia? O foco é a atração das grandes ou o fomento às pequenas e médias indústrias que já atuam nestas cidades?

José de Freitas Mascarenhas: É tudo ao mesmo tempo. O que nós não podemos fazer é inventar. Nós não vamos inventar empresário porque isso é um dom. O empresário tem que ter a capacidade de verificar que pode ser feito de uma maneira rentável. O que temos que fazer é ajudá-los, verificando onde estão estes surtos industriais. Vamos agir nestes locais. Também vamos ajudar no que podemos para diminuir os custos de produção. E trazer o governo do Estado a colaborar, exercendo seu papel de condutor das políticas para infraestrutura, terrenos e toda uma gama de ações que só o poder público pode fazer. Em 2010, foram anunciados alguns investimentos, como a ampliação do Complexo Ford e a formulação de um Complexo Acrílico em Camaçari.

A TARDE: O que a gente pode esperar já para 2011?

José de Freitas Mascarenhas: Vamos distinguir o que é realidade do que é proposta. O complexo acrílico é uma proposta que ainda vai depender de muitos arranjos para ser viabilizada. A ampliação da Ford é um fato. E a Ford tem que ser vista para além da fabricação dos automóveis. A Ford tem um centro de desenvolvimento no Estado que é uma das coisas mais importantes que a gente pode ter aqui, com 1.100 engenheiros trabalhando para desenvolvimento. A Ford de Camaçari hoje é uma das cinco fábricas que vai produzir o carro mundial. São fatos relevantes do ponto de vista do desenvolvimento local. A Braskem já anunciou a construção da segunda planta de plástico verde no País.

A TARDE: Até que ponto a Bahia se coloca na disputa pela planta?

José de Freitas Mascarenhas: O que posso dizer é que isso é uma possibilidade, sim, mas depende de uma série de negociações da Braskem. É uma indústria que poderia induzir uma produção maior de cana de açúcar na Bahia, a depender de negociações com produtores. É claro que se pode começar com importação de outras áreas, mas o ideal é que quanto mais perto esteja a produção de etanol, melhor.

A TARDE: Fala-se muito da necessidade de desenvolver a terceira geração da indústria petroquímica na Bahia, o que nunca aconteceu de fato. Falta vontade política ou viabilidade econômica?

José de Freitas Mascarenhas: As duas coisas são inseparáveis. A vontade política só não resolve nada. O industrial não se alimenta de decisões políticas, ele se alimenta de custos competitivos. É nisso que temos que centrar. O custo de produção deve ser levado em conta, porque infelizmente a Bahia está um pouco fora do eixo central. Mas funcionaria com um porto bom, um sistema de transporte bom, uma boa política tributária. Tudo isso se soma.

A TARDE: Como anda o processo de implantação da Zona de Processamento de Exportação (ZPE) em Ilhéus?

José de Freitas Mascarenhas: A ZPE é uma política federal. O sucesso dela vai depender da disposição do governo federal em dar apoio. O fato de ter o terreno estruturado e preparado não é suficiente. É preciso políticas públicas de incentivo, de estímulo, de coordenação, o que só o governo federal tem poder para fazer.

A TARDE: Em relação ao Porto de Aratu, a concessão é a solução mais viável para dar competitividade ao porto?

José de Freitas Mascarenhas: Acho que esta concessão pode ser o início da modernização do sistema portuário brasileiro, que ainda está muito corporativo e submetido a padrões fora dos valores atuais. Aprovar este projeto é importante não só para a Bahia, mas também para o Brasil. Temos que criar condições para ter portos modernos, assim como os portos internacionais com os quais competimos. Os nossos produtores precisam de portos eficientes de baixo custo para ter condições de vender no mercado internacional. Evidente que existem forças que pressionam para não mudar o modelo, o que significaria a continuidade da ineficiência dos nossos portos.

A TARDE: O que esperar da Bahia com a Ferrovia Oeste-Leste? Ela vai ter condições de interiorizar o desenvolvimento industrial da Bahia?

José de Freitas Mascarenhas: A ferrovia tem uma função imediata importantíssima que é de viabilizar o projeto de mineração da Bahia Mineração. Ela já começa com uma perspectiva de viabilidade. O resto depende da criatividade, do dinamismo, de empresários, de vários outros fatores que estão sendo considerados. A Bahia Mineração está fazendo um programa de fornecedoras que vai estar localizado no interior do estado. Por outro lado, a gente entende que a produção de grãos no oeste tem limitações. Ela não pode crescer no sistema atual com a retirada dos grãos por caminhões. Com a ferrovia, há possibilidade de incremento da produção. Isso que dá tanta esperança em relação a esta ligação ferroviária.

A TARDE: Além da construção Oeste-Leste, serão necessários outros investimentos em ferrovias?

José de Freitas Mascarenhas: É preciso propugnar por um corredor de transportes daqui para São Paulo por via ferroviária, que hoje é ineficiente. Esta demanda de transporte já havia sido manifestada por empresas como Braskem, Paranapanema, que têm grande volume de carga e que precisam disso. É preciso haver uma conversa com o concessionário (a mineradora Vale). A situação da Ferrovia Centro Atlântica virou a história do ovo e da galinha. Eles dizem que não tem investimento porque não tem carga e não tem carga porque não tem investimento. Evidente que ninguém vai colocar a sua carga em cima de uma ferrovia que não funciona. Tem que ter investimento para termos uma ferrovia moderna, de bitola larga e não com essa coisa atrasada, démodé. Já existe um leito pronto, o investimento a ser feito é marginal.

Fonte: A Tarde - Adaptado pelo Site da Logística

 

 

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